A única resposta que tinha para aquilo era revirar os olhos. Não era sua preocupação — nem do seu interesse — o que se passava na cama de Camilo, mas obviamente era uma das (poucas) coisas que ele poderia indubitavelmente criticar Camilo. Ao menos a moralidade do homem, ou a falta dela, nunca o deixava na mão. Era incrível sua habilidade de ser... Previsível. Era como se Camilo quisesse que todo mundo o visse apenas como uma imagem caricata de quem realmente era. O personagem mais clichê de uma comédia romântica, mas nesse caso fazendo de tudo para não entrar em num arco de rendenção. A mandibula se contraia involuntariamente — Matteo não se importava. Camilo podia fazer um bacanal que não era da sua conta. Não tinha nenhuma interação com Camilo em que ele enxergasse a possibilidade de acharem um meio termo naquele campo de batalha, que pudessem ao menos ser cordiais. Matteo estaria disposto à deixar de lado ao menos os insultos vazios e as ironias desnecessárias, mas Camilo não parecia interessado numa trégua e ele não estava disposto a tomar todos os tiros para ser alguém melhor.
Novamente, não era completamente imune a alfinetada trocada pelo mauricinho, mas ele não deixaria Camilo saber que aquelas palavras o incomodava. Não precisava de um lembrete de como as informações fugiam da sua mente ou se embaralhavam com outras informações de forma a se tornarem quase incompreensíveis. Não precisava ser lembrado de que ele não havia graduado com honras e que a universidade não estava nos seus planos. Não precisava ser lembrado que era sorte que havia conquistado e chegado aonde havia chegado, e o resto ele colocava nas mãos de gente que conseguia lidar com as informações de maneira estratégica, da forma que ele não conseguia. Ele confiava nos outros para guiar o seu destino. Mas não precisava de Camilo para lembra-lo daquilo de forma alguma. Sua mente indo a mil milhas por segundo e ainda assim ele não conseguindo ter as mesmas conclusões óbvias que os outros era um lembrete constante que ele não estava na mesma frequência que todo mundo. Seus músculos se contrairam com o toque. Instintivamente, ele se arrumava para a batalha, mesmo que aquela fosse apenas metafórica. Não iriam trocar tapas, nem socos, e aquilo era um testamento à sua determinação de não levantar a mão para Camilo. Para parecer menos tenso e deixar a foto mais natural, Teo levou a mão até o meio das escápulos do mais velho, olhando para o fotógrafo numa tentativa de tirar a mente do toque bizarro. Vestígio de uma realidade paralela onde talvez Camilo e Matteo se dessem bem. Com a aproximação súbita, Matteo quase deu um passo para trás instintivamente, sentindo o hálito quente de Camilo em sua pele; e o calor eriçando os pelos na sua nuca desconfortavelmente. Idiotamente, ele culpava a maldição, mesmo que não acreditasse naquilo. O fato de toda aquela fábula envolver os dois de certa forma era a única razão pelo qual ele sequer estava desconfortável naquela proximidade. Ele precisava colocar a distância entre eles novamente. "Por que você está preocupado com meu tamanho, Ricci?" Levantou a sobrancelha, tentando manter o sorriso falso que falhou por um momento. Ele não gostava de ser provocado, muito menos ele gostava de ter que dar satisfação para Camilo. Mas maldito seria se não o respondesse. "Eu ainda posso quebrar você no meio." As palavras duras possuiam grande dissonância com o sorriso que dava para as câmeras, mas tudo fazia parte do teatro e ele já tinha muito treinamento em manter um sorriso para as lentes agora que havia se recomposto o suficiente. "Ou que tal pergunta para Olivia? Ela não tinha nenhum problema com meu tamanho," forçou um sorriso amarelo para o outro. Se tinha algo imperdoável para Camilo, aparentemente, era o fato de Matteo ter namorado Olivia. Pelo que entendia, Olivia nem era ao menos para ser a pessoa que era prometida a Camilo. Era a sua irmã. Era ridículo que ele achasse que podia conquistar Liv com as coisas de família quando ela não seria nada além da segunda escolha.
tudo bem, sabia (beeeem lá no fundo) que não era justo considerar matteo um completo idiota. o próprio camilo não era a pessoa mais academicamente brilhante, embora compensasse com a esperteza safada adquirida durante a vida. acima de tudo, ricci sabia o que era ter pessoas duvidando de suas capacidades e do quão frustrante aquilo podia ser. se ele tomasse um tempo para olhar o mundo além do próprio umbigo, reconheceria que todas as suas provocações não apenas eram maldosas como equivocadas. se matteo fosse assim tão incapaz, como o mais velho estava acostumado a provocar, não teria tanto sucesso. mesmo um rostinho bonito - e um corpo melhor ainda - não seriam suficiente se ele não tivesse nada além para oferecer. mas de todos os momentos em que camilo poderia se disponibilizar a enxergar o outro por lentes mais gentis, aquele com toda certeza não era um deles. especialmente não quando toda aquela conversa de alma gêmea trouxera à tona mais do que nunca o ressentimento por olivia, e todo o sentimento de insuficiência que agora parecia querer instigar em bianchi apenas por despeito. "não se preocupe, isso está na minha lista para mais tarde." instintivamente os olhos buscaram caterina, a jovem loira casada com o presidente do banco da cidade vizinha, um homem pelo menos trinta anos mais velha que ela. então voltou a focar no adversário à frente, particularmente frustrado por sentir que ele era o único a lidar com aquela situação como se fosse uma competição.
ele preferia presumir que matteo simplesmente não era capaz de devolver suas provocações do que acreditar que o mais novo apenas não o considerava merecedor de seu tempo e esforço. talvez se ele engajasse naquela briga que camilo constantemente provocava, eles se socariam uma ou duas vezes e seguiriam em frente. mas não... toda vez que matteo se mantinha suficientemente controlado diante de cada provocação era como um golpe por si só. "é, você não é conhecido por saber muita coisa mesmo." respondeu, o tom repleto de cinismo. antes que pudesse ser ainda mais indelicado, um fotógrafo se aproximou solicitando uma foto. ricci concordou e ajeitou a postura ao lado de bianchi, erguendo o queixo para compensar os míseros dois centímetros que ele jamais admitiria separarem os dois. a mão esquerda se escondeu no bolso da calça e a direita foi até o ombro alheio, em uma espécie de abraço, dando uns tapinhas como se fossem amigos de longa data. não deixou de notar duas coisas: primeiro, o quão enorme eram as costas largas e musculosas do rapaz. ele próprio tinha um físico muito atraente, mas não era tão forte. segundo, o perfume que lhe atingira o olfato provocando uma reação absolutamente diferente do esperado. ele costumava se lembrar do cheiro das pessoas com facilidade, mas não se recordava de que matteo cheirava tão bem. especialmente para um homem das cavernas. talvez fosse a primeira vez que se aproximava dele sem ser após horas de exercício. franziu ligeiramente o cenho para os próprios pensamentos ridículos, um pequeno riso escapando e se camuflando bem como algo intencional para a foto. entre um clique e outro, aproximou o rosto do ouvido alheio, como quem está prestes a contar um segredo. "só te achei meio magrinho. acho que precisa tomar mais whey. ou bomba, sei lá o que você usa"
Não podia deixar de notar como ela havia ficado mais bonita. Mesmo na adolescência, Neslihan já atraia olhares — ao menos o seu olhar. Era um garoto magrelo e estranho com a única garota que era legal com ele, obviamente ele não era exatamente imune. E ela era bonita. Nada daquilo exatamente ajudava nas sessãos de estudo que tinha com ela. Os cabelos escuros estavam repuxados para trás num familiar rabo de cavalo, e ele se lembrava de como ela também puxava os cabelos para fora do rosto enquanto estava pensando. Quando era adolescente, ele era bem familiar com o perfil da mulher, espiando entre um exercício ou outro que não conseguia entender. Agora, não fazia questão de esconder que estava olhando diretamente para ela, afinal só haviam os dois naquela quadra.
"Nes," cumprimentou despojadamente. Apesar da distância entre eles, tanto física, quanto emocional, o apelido rolava dos seus lábios com facilidade e uma familiaridade estranhamente reconfortante. Não era exatamente como se soubesse o motivo deles terem se afastado. Não havia sentimento ruim da sua parte. Era apenas como se tivessem descobrido o quão diferente eles eram. Neslihan era muito boa para ele, no sentido que ela havia sido uma das poucas pessoas a ser gentil e amigável, de ter diversas vezes se colocado entre os tiros dados para ele. Ao mesmo tempo, ela era muito melhor que ele em tudo. Havia mais financeiramente, materialmente, emocionalmente, em seu raciocínio. Ele constantemente se sentia um completo desajustado ao redor dela. Era como se ela refletisse todas as coisas em que ele falhava miseravelmente. Ao mesmo tempo, ela não o fazia se sentir mal consigo mesmo. Não, Matteo fazia tudo aquilo dentro da sua própria mente, enquanto Nes não era nada além de agradável. Quando Matteo finalmente começou a não se sentir tanto o patinho feio... Ela já estava distante. Seu ego talvez tivesse ficado um pouco ferido de nunca poder ter mostrado seu outro lado, mas não havia ressentimentos da sua parte. Só não sabia se havia algum da parte dela, do motivo que poderia ter levado ao seu afastamento. "Não venho há algum tempo," falou, notando que não era exatamente a verdade e, junto dela, se sentia compelido a falar a verdade, mesmo que não viesse com naturalidade, "na verdade, não venho faz alguns anos." Sentiu o rosto aquecer levemente com o fato que as palavras rolavam com mais facilidade do que gostaria. O sentimento de familiaridade ao redor dela, como se tivessem estacionado no tempo. Talvez Matteo precisasse de passar algum tempo fora da academia e com um outro ser humano porque aquela carência para alguém que não lhe dava atenção num período de quase treze anos deveria ser deprimente.
"Aceito a companhia," ele disse, deixando a própria sacola cair próxima dela com a raquete também repousada no chão enquanto se curvava sobre as pernas num aquecimento rápido, "mesmo que já sabemos que vai ganhar, não é?" Suas habilidade com a raquete poderia ter melhorado, mas nada se comparava com todo o treino que ela havia tido durante anos. Para Matteo, aquele esporte era um passatempo na sua rotina que ainda o mantinha ativo, mas ele achava que era mais que aquilo para ela. "Como—como você está?" Perguntou de forma hesitante, mas inocente. Não queria pular para o assunto da maldição, da cachoeira, nem que havia visto ela com Camilo no restaurante. Ele queria ver se o senso de familiaridade que sentia era apenas coisa da sua imaginação ou se ainda existia alguma camaradagem entre eles.
antes mesmo que os primeiros raios solares rasgassem o véu da madrugada , neslihan já percorria o caminho até o pequeno complexo esportivo , a raquete equilibrada entre os dedos . o aroma fresco da grama recém aparada , meticulosamente ajustada aos padrões internacionais , impregnava seus sentidos , oferecendo um instante fugaz de alívio . mas nem mesmo aquele perfume familiar conseguia dissipar por completo a sensação de exaustão latente , o peso dos dias recentes transformando-a em um animal ferido , perdido na escuridão de uma floresta desconhecida . retirou o cardigã , sentindo o arrepio escalar-lhe os braços sob a brisa cortante da alvorada , após depositar a bolsa junto à rede — um ritual já automático — , com as raquetes extras . por vezes , dependendo do humor , estourava as cordas de poliamida com a força desmedida de seus golpes , como se o próprio equipamento carregasse consigo a frustração acumulada , então sempre trazia as excedentes . com os cabelos firmemente presos no alto da cabeça e os nervos tensionados , não desperdiçou tempo com aquecimentos triviais . a corrida ao redor da villa , antes de ceder à tentação de pegar o carro e dirigir até ali , fora mais do que suficiente para preparar os músculos . seu único objetivo era derrotar a máquina lançadora — um adversário silencioso , preciso e incansável . e assim , a mulher se perdia nos movimentos meticulosamente calculados , os golpes ressoando contra as cordas tensionadas da raquete , canalizando a exasperação que lhe queimava por dentro . o tempo se tornava irrelevante , a única certeza era o alívio sutil que se insinuava em seus ombros , a rigidez gradualmente cedendo enquanto sua mente se libertava das inquietações que , dia após dia , pareciam se entranhar mais fundo em seu consciente .
um sorriso despontou quando sua memória a transportou para o instante em que segurou uma raquete pela primeira vez — uma das muitas exigências paternas . dentre todas , talvez aquela fosse uma das poucas que ainda preservava com apreço , mesmo que , na época , as cordas fossem de tripa natural , um material que agora se recusava a sequer ponderar . o cenho se franziu ao recordar os treinos extenuantes , excessivos para uma criança sem qualquer ambição profissional no esporte , mas menos que a perfeição jamais fora aceito sob o teto dos şahverdi , então se tornou a norma . a respiração adquiriu uma cadência melancólica ao lembrar dos dias em que tinha companhia – uma companhia que ia além da miríade de treinadores cuja simples presença a fazia desejar nunca mais encará-los . matteo surgiu em sua mente como um relâmpago — um vestígio confuso em sua mente com a forma como tudo havia se desfeito , em meio ao caos infernal no qual ela era a personagem principal .
com o suor escorrendo por cada poro de sua pele , sacudiu as memórias com um último golpe certeiro na bola final lançada pela máquina . levando as mãos à cintura , puxou o ar límpido da manhã para dentro dos pulmões exaustos , contando mentalmente até dez . na última expiração , foi arrancada de seu momento de trégua por uma voz masculina . por um breve instante , sentiu a alma sair do corpo , como se sua própria lembrança tivesse evocado matteo em carne e osso à sua frente . com a destra pousada sobre o coração acelerado , inclinou levemente o quadril e esboçou um sorriso contido — um reflexo de algo reprimido há muito tempo , ou talvez apenas até o momento em que todos foram tragados pelo mistério que pairava sobre khadel como um véu espectral , quando sua rotina meticulosamente planejada começou a ruir . ❝ ei , teo . ❞ o apelido escapava com naturalidade , como se treze anos não tivessem se esgueirado entre eles sem quase nenhuma palavra trocada . enquanto caminhava até a bolsa deixada ao pé da rede , procurando pela garrafa d’água , seus olhos captaram um detalhe que fez o pequeno sorriso persistir , a raquete que pendia das mãos dele , os adesivos no cabo denunciando sua familiaridade . ❝ nunca te vi por aqui antes… mas suponho que nossos horários se diferem na maior parte dos dias . ❞ ergueu uma sobrancelha , indicando com o olhar o objeto desgastado entre os dedos masculinos . ❝ veio jogar sozinho ou aceita companhia ? ❞ a pergunta carregava o mesmo tom melancólico das lembranças que há pouco enevoaram seus pensamentos . ❝ eu poderia usar um adversário mais desafiador . ❞
A hostess se aproximou da mesa com um homem que definitivamente não era quem ele esperava e estava pronto para contradizer, mas a expressão resoluta da mulher e as palavras que se succederam do homem deixou claro que ele estava onde deveria estar, por mais confuso que fosse. "Encontro?" Matteo repetiu sem entender o que estava acontecendo. Ele achou que iria encontrar o próprio amigo. Será que tinha entendido tudo errado? Óbvio que Nico estava achando graça em toda essa coisa de alma gêmea e tinha que fazer algo cômico, as suas custas. E óbvio que ele iria colocar Matteo com... Aaron? Lembrava vagamente do outro na cachoeira, mas nunca tiveram muito contato antes. A cidade é pequena e, em certo nível, todo mundo se conhece, mas além do nome e de onde o homem trabalhava, seu conhecimento sobre o outro acabava ali. Ao menos, o fato dele não saber nada sobre Aaron fazia ele ser mais provável de ser sua alma gêmea, pelo benefício da dúvida. Ainda confuso com as circunstâncias, Nico deveria ter dito as palavras de uma forma que o deixasse confuso porque saberia que se ele tivesse sugerido um encontro às cegas, Matteo jamais teria aceitado. A sua vida amorosa não era tão humilhante assim. Ele poderia ter quase todo mundo que quisesse, o problema era querer. Não era como se esperasse exatamente um grande romance, nem nada desse gênero, mas Matteo achava que não tinha tempo a perder em relacionamento vazios. Se não tinha um mínimo de excitação nesses relacionamentos, porque perderia seu tempo dando atenção para outra pessoa quanto ele mesmo precisava do seu foco total. "Matteo," disse, pegando a mão do homem e cumprimentando brevemente. Parte dele gostaria de correr, deixar todo o encontro para trás, mas toda a história de maldição o estava deixando curioso. E também estava curioso para saber o que aqueles que estavam envolvidos também achavam. "Por que eu saio no lucro? Você é uma ótima alma gêmea ou algo do tipo?" Perguntou, apertando os lábios num rápido sorriso entretido enquanto se sentava na cadeira em frente e pedia uma água com limão.
Aaron ergueu os olhos do cardápio assim que ouviu passos se aproximando. Ele já estava considerando que teria que sair dali em mais alguns minutos, só para poder dizer que tentou. Mas, ao ver quem a hostess estava guiando alguém até a sua mesa, arqueou uma sobrancelha. "Hm...Você definitivamente não é o que eu esperava." Blackwell acabou murmurando sem querer. Quando aceitou ir a um encontro às cegas no lugar de Nico Cagni — depois de perder uma aposta — jamais pensou que seu date pudesse ser um homem. Fechou o cardápio com calma e o apoiou sobre a mesa, inclinando-se ligeiramente para frente enquanto estudava o outro. Por fim, quando viu a atendente se afastar, decidiu se levantar, estendendo a mão na direção do moreno. "Aaron Blackwell, prazer". Indicando a cadeira vazia em sua frente, como um convite ao que quer que fosse aquilo, Aaron voltou a se sentar. "Sei que não sou o que você estava esperando, mas Nico não podia vir a esse encontro e pediu que eu viesse em seu lugar. Normalmente eu não faço esse tipo de coisa, mas...", deu de ombros. "Tinha uma dívida para pagar". E existem formas piores de pagar do que ir para um encontro. "Bom, já que estamos aqui, podemos pelo menos pedir algo. O vinho e a comida já estão pagos por Cagni, e eu definitivamente não vou recusar um jantar decente." Levantou um pouco a taça que já tinha em mãos e lançou um olhar divertido para o rapaz, que parecia confuso. "Bom, e considerando as opções, acho que você saiu no lucro."
Observava-a pelo canto do olho, como anteriormente o fazia, sempre que achava que ela não notava. A proximidade que criaram durante os anos era... Excêntrica. Por um lado, o que os aproximou havia sido a ajuda que ela lhe dava nas matérias, como uma professora diligente, porém muito mais atenciosa com a sua dificuldade de compreensão do que seus próprios professores. Por outro lado, Matteo podia ficar escutando-a falar por horas, sobre qualquer outro assunto, assistindo envolto desde jovem o cometa que ela era. No auge dos seus quatorze anos, entretanto, ele não tinha desenvoltura o suficiente para sequer entender a atração, ou fazer algo sobre isso e, quando ela se afastou, ele definitivamente não tinha maturidade emocional suficiente para ir atrás e entender o que aconteceu. Ele deixou-a ir, sem brigas e sem esforços. Com o passar dos anos, pensou menos e menos no que poderia ter feito errado, aceitando o acontecimento apenas como fatos da vida. Agora, anos depois, talvez ele devesse ter se arrependido, tentado entender melhor o que houve, ou simplesmente não tê-la deixado ir com facilidade. Mas não podia fazer nada sobre.
Para ele, o sucesso não importava muito. Era apenas um trabalho. As pessoas provavelmente acreditavam que Matteo adorava chamar atenção, entre o instagram e o fato de não dar muita atenção à ninguém ao redor dele como se ele estivesse trabalhando o tempo todo com psicologia reversa, mas a verdade era bem mais simples; ninguém o entenderia. Ninguém compreenderia todas as distâncias que ele percorreu para simplesmente se encaixar e, ainda assim, não sentia que fazia parte ali. Não entenderiam o olhar para o espelho e ainda ver um adolescente estranho por atrás da própria imagem. Por isso lhe contava em uma das mãos seus amigos, por isso não conversava muito com ninguém. Quanto mais intangível fosse, mas fácil era manter a ilusão de que Matteo não somente se encaixava, mas talvez fosse melhor que eles. Ilusão essa que era tão facilmente desmanchável na sua cabeaça que exigia esse esforço dele. Ainda assim, fez o que era ncessário — o sorriso curto, as palavras baixas, silenciosas, 'obrigado'. O que mais podia fazer quando alguém o parabenizava? Não sentia-se merecedor, mas não iria deixar outra onda de palavras que não deveriam fazer seu caminho para fora serem vomitadas naquela conversa. O pouco que Matteo podia realmente sentir era orgulho de ter construído algo, por mais frágil que isso fosse, quando o que escutava era que nunca iria valer nada. Ou como o que construiu dava uma vida mais confortável, não apenas para ele, mas para sua família. O orgulho de simplesmente ser algo há mais quando não ouviu que iria muito longe por anos no ensino médio.
Ao ouvir a hesitação e a escolha de palavras, não sabia nem como reagir. Matteo não era exatamente tímido em relação à sua forma ou ao seu corpo, afinal, parte do seu trabalho requeria que ele compartilhasse do corpo, muitas vezes com pouca roupas, sem nenhum pudor. Mas, o comentário de Nes transformava-o automaticamente no adolescente estranho e desengonçado novamente, sem consciência corporal dele mesmo. Era uma surpresa que ele não tivesse deixado a raquete bater em sua própria cabeça depois disso. Não podia restringir o rubor de subir as bochechas, mas podia fingir a atitude blasé que sempre tinha, como se aquilo não fosse nada. “Confuso pra caralho,” as palavras saiam com mais facilidade do que ele gostaria de admitir. Sentia um leve alívio de poder falar aquelas palavras em voz alta. As únicas pessoas que podiam, de fato, entender o que acontecia com aquele grupo, eram pessoas do próprio grupo e Matteo ou não tinha intimidade com os individuais, ou tinha um relacionamento complicado. Não era como se ele realmente acreditasse nas coisas de maldição, mas a pergunta que circulava em sua mente era 'por que ele?' Ele deu um sorriso fraco quando Neslihan perguntou sobre a sua mãe, “está ótimo como sempre.” O relacionamento entre eles era bom, mesmo que não fosse perfeito. Com o passar dos anos, foi melhorando, quando Matteo deixava de ser um pequeno estorvo e passava a ser independente. O ápice provavelmente havia sido ele ter proporcionado mais para sua família, como se finalmente o fato dele ter sido um impedimento na vida dela tivesse se pagado. “Na verdade, essa história parece empolga-la,” ele disse, com um sorriso fraco e frouxo. Sua mãe sempre foi adepta ao amor. Ao menos, era o que ela falava. Os livros que lia, os filmes que assistia, e as músicas que gostavam, sustentavam uma ideia de amor que ela nunca conseguiu encontrar. Então o fato de tudo aquilo realmente existir e ela não encontrar o amor não ter sido sua culpa, parecia deixá-la em paz. “Você sempre pode ir lá, sabe?” Matteo sugeriu. A existência dele provavelmente não deveria ter ficado entre elas, se fosse escolha da sua mãe. Nes era provavelmente a filha que ela não teve e, logicamente, a próxima opção era que eles acabariam em um relacionamento. Para sua infelicidade (da mãe dele, do Matteo mais jovem também), esse nunca foi o caso. “Ela ainda adoraria ver você.” Sua mãe nunca entendeu o afastamento deles e Matteo também nunca soube explicar. Porém, depois de algum tempo, ela parou de importuna-lo sobre o assunto, vendo que as coisas não voltariam a ser como eram antes. Mas, novamente, ele não queria trazer aquele assunto a tona, receosso que aquilo pudesse mais incomodá-la do que ajudá-los. "Ela fica muito irritada que eu não como mais cannolis como antigamente."
ainda que o tempo os tivesse transformado em completos desconhecidos emocionais — não que a proximidade outrora compartilhada tivesse sido imensamente profunda, e tampouco por falta de vontade de sua parte — em khadel , era virtualmente impossível não ser alcançada por sussurros e boatos sobre qualquer um . de longe , acompanhara a ascensão de matteo , do antigo companheiro de estudos ao influencer e modelo reconhecido , desejando poder oferecer sua alegria que sentia ao vê-lo conquistar e alcançar , ainda que de uma maneira contra ela mesma lutava , aquilo que sempre almejara . então, neslihan jamais acreditara que ele precisasse se transformar para ser aceito , não quando sempre fora extraordinário sem qualquer esforço . sentia o olhar dele pousado sobre si , aquela sensação estranha e , ao mesmo tempo , agridocemente familiar , reacendendo a habilidade que desenvolvera na adolescência de perceber a presença dele sem que uma única palavra fosse dita . evitava pensar na forma como havia desfeito aquele laço , como simplesmente o ignorara sem explicações , sem justificativas , e , mais ainda , na maneira silenciosa com que ele aceitara sua ausência . vê-lo com olivia não a surpreendera — faziam sentido juntos . e , sendo ambos absurdamente especiais , se encontrassem felicidade um no outro , ela comemoraria . mas então , como era da curiosa norma da cidade , distanciaram-se , e a gökçe jamais ousou mencionar matteo à boscarino .
volvendo a atenção para a raquete que parecia quase anciã no aperto masculino , custava a crer que ele a mantivera todos aqueles anos . notava os vestígios de poeira ainda presos entre as cordas , assim como as figuras que colara pouco antes de matteo tomá-la emprestada e jamais devolvê-la . não que houvesse se importado na época , nem mesmo quando fora punida por kadir pela suposta irresponsabilidade de tê-la perdido . sua mente adolescente , fascinada , via no gesto uma tentativa inconsciente de manter consigo algo dela . assentiu quando ele confirmou que já não praticava tanto e riu baixo ao perceber a forma como se corrigia , como se as palavras lhe escapassem quase em confissão , e ante o leve rubor que tingia a pele bronzeada. ❝ bem , imagino que não sobre muito tempo , entre a academia e o seu trabalho . ❞ deu de ombros , encontrando os olhos dele , um sorriso genuíno curvando os lábios . ❝ falando nisso , acho que não cheguei a te dizer como fiquei feliz pelo seu sucesso . ❞ achar era um eufemismo indulgente — não o dissera , arrependida da turbulência que a engolira e fizera com que o deixasse para trás . e não era apenas felicidade o que sentira na época — mas orgulho .
por um instante , observou-o alongar . os movimentos agora eram fluidos , tão distintos da postura inibida de quando eram mais jovens , e ainda assim havia nele um resquício do garoto que , de alguma forma , conquistara partes da criança e da adolescente que ela fora . ❝ posso moderar meu ritmo para ser mais justa , embora duvide que seja necessário . você está muito mais... em forma do que me lembro . ❞ piscou para ele , tentando disfarçar a hesitação sobre o adjetivo a ser usado , sem revelar os verdadeiros pensamentos . meneou a cabeça para si mesma antes de girar nos próprios calcanhares em direção à lançadora , empurrando a máquina para a linha lateral e recolhendo as bolas sobressalentes . lançou uma para as imediações da rede , para ser utilizada , quando a hesitação na voz alheia a fez pausar por alguns instantes , de costas para ele . por cima do ombro , encontrou o olhar que a acompanhara . ❝ levando em consideração tudo o que aconteceu e vem acontecendo... surpreendentemente ainda sã , e você ? ❞ aproximando-se , abaixou-se para apanhar a esfera amarelada e felpuda que havia arremessado . ao se erguer , apoiou um dos quadris contra o poste , aguardando-o finalizar . ❝ e como está signorina giulia ? sabe que ainda sonho com os cannolis que ela fazia ? ❞ recordava-se da figura materna do bianchi , por vezes , com mais afeto do que da própria , e o termo respeitoso escapava dos lábios com a mesma naturalidade que parecia ter voltado a ela sem que percebesse .
com @sorrentinosmuse no banho de ervas aromáticas
Matteo se sentia atraído pelo evento de alguma forma. Talvez fosse relacionado a maldição que, agora, ele hesitantemente acreditava. Principalmente depois que ele foi até a cigana e agora ele não conseguiu mais se sentir confortável na sua pele ou olhar o seu reflexo no espelho. Talvez por acontecer na casa de Rose Von Bleicken, que ele se via voltando dia após dia. Talvez fosse porque ele não quisesse ficar dentro da própria casa, onde os espelhos estavam cuidadosamente cobertos. Ir na academia era uma pequena sessão de tortura, onde ele assistia o seu eu de quatorze anos levantando cento e quarenta kilos. Naquele evento, ele podia evitar tudo isso e cada dia parecia carregar uma nova surpresa para ele. Naquele dia, ele estava olhando os produtos à venda no L'Erbario di Gilda. Isso é — até Nonna Gilda aparecer com um som ultrasônico, "i miei amanti," ela disse, abrindo um braço para ele e outra para alguém atrás dele. Matteo olhou por cima do seu ombro, vendo a figura de Helena. Ele queria resmungar, audivelmente, mesmo que ele tenha até partido em bons termos com Helena. Ele não estava com disposição para a personalidade gigante dela. Mas parecia que eles estavam sendo arrastados já para dentro de algo que parecia uma tenda improvisada, com cheiros fortes. "A gente só tem que ser forte e aguentar um pouco," ele finalmente murmurou em direção a Helena.
@khdpontos
com @alekmoretti em autocuidado e terapias táteis
"Ah," o assistente disse alto, batendo as palmas juntas, com uma felicidade nada necessária, "ele disse que a dupla dele ainda estava aqui fora." Matteo olhou ao redor, esperando que ele estivesse falando com outra pessoa, mas só tinha ele no momento ali. Franziu as sobrancelhas juntas. Será que alguém estava lhe pregando uma peça? Matteo estava mais do que acostumado com algumas perripécias de desconhecidos para ficar sozinho com ele, como se ficar sozinho fosse fazê-lo mudar de ideia sobre o que ele queria, mas num evento que parecia tão obcecado nos apaixonados e na maldição, não fazia sentido fazer algo dessa forma. "Acho que você está me confundindo com alguém," respondeu, apesar das chances dele ser confundido serem ínfimas. Confundido com a porta? Bem que ele preferiria. Seria alguma surpresa de Olivia? Ela adorava essas coisas. Mas eles já estiveram naquele stand — não faria sentido estarem ali novamente. Apesar do dobro do tamanho, Matteo não ofereceu resistência para o assistente. Imaginou que ele só estivesse fazendo o seu trabalho, e por saber que ele podia machucar a maioria das pessoas normais, ele raramente oferecia resistência.
Foi empurrado para dentro de um outro quarto, levemente irritado. Seu humor nos últimos dias não estava dos melhores. Entre o fracasso do ritual, o maldito espelho, as lembranças do baile dançando em sua mente quando menos esperava... Matteo já nem sabia se amor realmente importava. Pelo que ele estava fazendo aquilo? Amor? A ideia era quase risível. A única pessoa com quem se importava era Olivia, e se ela não fosse sua alma gêmea? Estava cansado daquela brincadeira da Zafira — ela estava fazendo uma grande piada deles. Quando seus olhos se depararam com a pessoa que parecia ter perdido o parceiro, Matteo balançou a cabeça rapidamente, negando como se tivesse preso dentro de um sonho ruim. "Não — não," ele rosnou por baixo da respiração, virando para a porta, "tem algum engano aqui." Sua voz era veemente. Ele tinha que sair dali. "Divirtam-se," o assistente falou antes de sair e, com um click metálico, trancar eles ali dentro. Matteo não lembrava disso de quando esteve ali com Olivia. Não tinha certeza se aguentaria Aleksander enchendo o seu saco por algumas horas. Talvez partisse para assassinato. O outro era movido a uma pilha inesgotável — como se lhe encher o saco o energizasse — e Matteo, quem nem em seus melhores dias conseguia tolerá-lo, não estava nos seus melhores dias.
Ele suspirou pesarosamente e decidiu se sentar no chão, em silêncio, como se sentar na cama fosse perigoso demais. Tentava racionalizar que o beijo entre eles apenas havia acontecido porque não sabiam quem era o outro — nunca teria acontecido em circunstâncias normais, nem fora daquela festa. O único problema era que o fato lhe atormentava demais para algo que ele dizia não importar. Descansou os cotovelos nos joelhos e cruzou os braços para abaixar a cabeça, como se não olhar ao redor fosse fazer o tempo passar mais rápido. Se não fosse maluquice, ele diria que Aleksander planejou aquilo para lhe encher o saco — assim como havia aparecido na academia com parte da sua fantasia para lhe assombrar. Para quem me odeia tanto, ele aparece um assustável número de vezes na minha vida sem ser convidado, pensou. "Não sei porque eles pensaram que eu era seu par," finalmente falou, se defendendo daquela maluquice. Não era uma novidade na cidade que Matteo e Aleksander não se davam bem. Talvez o assistente apenas acreditasse que era uma boa pegadinha, colocar os dois 'apaixonados' que se odeiam numa sala para se massagearem — como se eles fossem fazer isso.
@khdpontos
Ele balançou a cabeça, esboçando pela primeira vez naquele encontro um pequeno sorriso. A ideia de que a maldição existia, para Matteo, era juvenil e uma forma de se eximir da responsabilidade que um relacionamento tinha. Haviam diversos casais casados em Khadel. Estavam todos eles fingindo? Era tudo uma ilusão? E por que as pessoas participariam daquele surto coletivo? Para ele, o fato dele, ou pelo menos aqueles ao seu redor que reclamavam da falta de amor, era o que acontecia naquela geração. As redes sociais criavam expectativas irreais, as pessoas estavam distantes, não se conectavam, e ninguém queria se dar o trabalho ou ceder. No seu caso, Matteo simplesmente não queria se dar o trabalho. Não negaria a existência do asco, mas como ele via era apenas uma resistência para as pessoas realmente se aprofundarem umas as outras. Era o seu cérebro dizendo que não valia a pena e, por isso, era muito fácil virar as costas. "E quais são exatamente os efeitos dela?" Perguntou com certa curiosidade, porque ela devia enxergar algo além do que ele via. Era quase engraçado como as percepções das pessoas eram diferentes, porque se ela parecia envergonhada falando, a descrença de Matteo era quase palpável. Ele não precisava de desculpas para o seu comportamento. Não precisava explicar a sua falta de amor. Já havia aceitado o seu destino e percebido que as pessoas não faziam por se merecer, então era tão mais fácil estar sozinho. Não se consideraria egoísta em outras situações, menos no 'amor' (ou falta dele). "Eu não acredito que a gente não ame por causa de uma maldição, Helena." Por mais que não compartilhasse a mesma visão da Helena, ele não queria minimizar a experiência dela. As pessoas podiam acreditar no que quisessem. Não se sentiria bem se ela virasse e o considerasse um idiota porque ele não acreditava naquela história.
"Você já tentou, Helena? Mas tentou de verdade?" Porque Matt podia dizer que ele não havia tentado tanto assim. Ao primeiro vestígio de algo, Olivia se afastou e Matteo não fez questão de tentar nada que pudesse os manter juntos. Ao seus olhos, aquele era o motivo de não amarem, não uma maldição. Se todos desistissem tão fácil quanto ele, ninguém poderia passar das suas próprias barreira para o amor.
Por mais que fosse algo tão natural quanto respirar, Helena não queria dar a impressão de que ostentava um rei na barriga por sua fama ou se vangloriava do que havia conquistado. Em Khadel, ou melhor, naquele encontro, ela queria ser apenas a Lena: a mulher determinada, divertida, capaz de conquistar a simpatia de qualquer um, e não a atriz famosa, com ares de soberba, que havia sido criada ao longo dos anos. No entanto, o rapaz à sua frente não parecia colaborar muito para tornar a noite agradável, afastando cada vez mais a ideia de que ele pudesse ser sua alma gêmea.
"Bem, eu sempre senti os efeitos dela, então não tenho como desacreditar..." admitiu, um pouco envergonhada por estar compartilhando aquilo. Não era algo que gostava de relembrar e muito menos de falar. Eram anos de desamor que tinham deixado cicatrizes, tanto que só de lembrar do gosto amargo das despedidas ainda permanecia nos lábios. Não era perfeito sumir antes que pudesse sentir mais do que amizade ou carinho, mas era uma forma de se proteger e uma forma de mostrar o afeto genuíno, afinal não gostava de guardar sentimentos ruins por aqueles que gostava. "Você não acredita? Digo, porque se isso for real a gente pode, não sei, voltar a amar!" continuou um tanto animada mudando de posição para ficar um pouco mais inclinada em direção ao rapaz
Nos olhos dela tinha um brilho de esperança que chegava a ser triste de ver. Porque nada tinha lhe dado a certeza que daria certo, mas ainda assim a fé que tinha crescia e dava a ela uma força para tentar "Vivemos uma vida incompleta Matt, se eu puder sentir nem que seja um gostinho do que eu vejo nas telas..." por um momento ela parou no lugar olhando em volta antes de suspirar e voltar a se encostar na cadeira "Sei lá, acho que todos merecem mais do que isso." Eu mereço mais que isso.
Starter fechado para @aaronblackwell
VINÍCOLA VILLA GIORDANO
Nico havia dito para encontrá-lo na Villa Giordano no fim da tarde, mas já se passaram dez minutos do horário acordado e nada do seu amigo aparecer. Normalmente, Matteo não bebia muito. O álcool era uma das piores coisas para a sua rotina de treinos, ou para sua mente afobada. Porém, nas atuais circunstâncias, uma taça de vinho, ou mesmo algo mais forte, não lhe soava mal. A pressão de atingir um nível de perfeição com sua aparência não chegava nem perto da pressão de encontrar uma alma gêmea.
Irritado que devia ter levado um bolo, Matteo tentou a última coisa possível e entrou no estabeleciment, se aproximando da hostess, "Oi," Matteo cumprimentou com brevidade, soltando o ar pesarosamente, "eu estou procurando Nico Cagni. Sabe se ele chegou?" A hostess olhou para o tablet com as reservas antes de falar para ele segui-la, levando-o para uma das mesas na parte externa.
Clean shirt, new shoes And I don't know where I am goin' to
@khdpontos
Deu um curto aceno de cabeça para indicar que não havia sido um grande problema. Matteo estava ciente, em primeira mão, em como aquela atenção era chata. Os olhares que o acompanhavam para todo lugar nunca foram tão intensos quanto agora e tinha a sensação sufocante que as pessoas colocavam mais esperança naquela história do que deveriam. Ele nem ao menos acreditava que aquele grupo de desajustados tinha poder de mudar alguma coisa. Porém, se não podia ajudar toda a população, ao menos pode ajudar, Christopher. O que ele deveria realmente agradecer é que elas não olharam ambos como dois pelo preço de um. Talvez a sua fama de rabugente estivesse sobressaíndo ao seu título de solteiro cobiçado. Ou talvez estivesse esperando que eles sutilmente estivesses num encontro. O que, para Matteo, era um pensamento ridicularmente cômico. A ideia de Christopher ser sua 'alma gêmea' parecia tão impossível quanto Camilo Ricci. Se ele acreditasse em um destino cósmico, eles provavelmente seria uma piada cósmica para todos. O que, além do local em que nasceram, tinham em comum? Ele olhou Christopher de cima a baixo ─ tudo bem, não o conhecia de verdade, mas entre sua amizade com aquele que era seu nêmesis, sua profissão e a sua cantoria pelos bares da cidade, Matteo não via nada em comum entre ele. "Aparentemente alguém começou um rumor que se você transar com um reencarnado, você consegue se apaixonar," respondeu meio sem emoção. Ouviam rumores diferentes sobre os reencarnados todos os dias. Os rumores em relação à maldição estava começando a sair do controle desde que Olivia anunciou para todo mundo em praça pública a confirmação deles. Não que ele já tivesse aceitado essa condição. Matteo não se colocaria naquele grupo tão cedo. A distoância entre eles é nítida, mas ele não estava desconfortável com o novo companheiro do dia. Talvez porque estivesse no único lugar onde se sentia verdadeiramente a vontade, talvez a cada dia que passasse se importasse menos com o status. A confusão mental que o dia na cachoeira trouxe parece menos assustadora a cada dia que passava. "A menos que você queira voltar para os urubus," ele disse, olhando por cima do ombro para as mulheres. Elas já tinham se dissipado, mas ele ainda pegou uma ou outra olhando furtivamente para o homem. Seu suspiro foi longo, mas não se pendeu muito nos outros. Não era comum para ele ter um companheiro, a menos quando estava treinando alguém especificamente. Não era exatamente o caso dele, mas não duvidava que a forma de Christopher em um exercício ou outro seria o suficiente para lhe irritar e fazer com que ele mostre o correto. "Você tem um plano?" Ele perguntou, ao menos para ele era óbvia a referência ao plano de exercício, ao que iria fazer na academia, ou ao menos qual músculo iria trabalhar. Se iriam enfrentar aquele dia juntos, tinham que ao menos estar nos aparelhos próximos.
Christopher estava longe de ser um exemplo de dedicação ao condicionamento físico. Fazia apenas o necessário para manter a estética dentro dos seus próprios padrões e, depois, agradecia silenciosamente ao universo por ter sido agraciado com uma boa genética. Diferente do prazer genuíno que sentia ao passar horas sozinho, dedilhando as teclas do piano ou as cordas do violão, a academia lhe causava uma sensação quase claustrofóbica — especialmente em dias lotados como aquele. O espaço tomado por corpos suados, aparelhos disputados e, pior ainda, a presença inevitável de indivíduos cuja relação com o desodorante parecia inexistente tornava tudo ainda mais desagradável. Ainda assim, fazia questão de ir um pouco além do mínimo. Confiava na sorte, mas nunca a ponto de depender apenas dela.
Naquele dia, Christopher se arrependeu de cada gota de combustível desperdiçada para chegar ali. Assim que cruzou a entrada, foi imediatamente cercado por uma enxurrada de pessoas, todas ávidas por respostas que ele não queria — ou simplesmente se recusava — a dar. Perguntas sobre a maldição, sobre quem ele achava ser sua suposta alma gêmea e uma infinidade de outras especulações ecoavam ao seu redor, tornando impossível fingir que não as ouvia. Foi então que uma voz masculina se destacou no meio do burburinho, chamando por ele. Ao virar-se na direção do som, Christopher avistou Matteo. "E aí, Matteo. Já estava achando que ia se atrasar no primeiro dia." Apesar da falta de proximidade entre eles, reconhecia o outro perfeitamente — não apenas pelas incontáveis vezes em que ouvira Camilo xingá-lo, mas também pela fatídica noite na cachoeira. Não tinha uma opinião formada sobre Matteo, mas, naquele momento específico, depois de ser salvo daquela multidão insuportável, o cara facilmente poderia ocupar o top cinco de sua lista de pessoas favoritas.
"Valeu por isso." Murmurou em um tom mais baixo assim que se afastaram do grupo. Ainda lançando um olhar discreto por cima do ombro, como se temesse que os curiosos voltassem à carga, Christopher fez uma careta antes de resmungar: "Por um momento, achei que era uma carcaça cercada por urubus." Endireitou a postura, tentando recuperar um ar de normalidade e evitar atrair mais atenção indesejada. Depois, voltou o olhar para Matteo, avaliando-o rapidamente antes de soltar, com um misto de simpatia e incerteza: "Isso quer dizer que o treino de hoje vai ser em dupla...?" O tom era amigável, mas a hesitação era perceptível. Afinal, não se conheciam de verdade, e Christopher ainda tentava decifrar qual seria a melhor maneira de lidar com ele.
75 posts